quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Liderando com visão e energia


"Não caminhe atrás de mim; eu posso não liderar.
Não caminhe na minha frente; eu posso não seguir.
Simplesmente caminhe ao meu lado e seja meu amigo."(Albert Camus)


Robert Cooper é um especialista em inteligência emocional e neurociência da liderança, autor da interessante obra “Get out of your own way”, ou seja, “Caia fora de seu próprio caminho”, numa tradução livre, na qual ele apresenta cinco chaves para exceder expectativas.

A estas cinco chaves, acrescentei outras duas, totalizando sete aspectos essenciais no processo de liderança. Vamos a eles:

Chave 1 – Lidere pelo exemplo

Uma meta é resultado de inteligência integrada aplicada. Suas decisões devem decorrer de união de três cérebros localizados na cabeça, no coração e nas vísceras. Liderar só com a cabeça limita a criatividade. Você deve ouvir seu coração, mas também dar atenção ao seu feeling – aquele frio na barriga que sentimos por ocasião de algumas ações.

Chave 2 – Administre a direção, não o movimento

As estatísticas apresentadas anualmente pelas revistas que relacionam as maiores empresas globais comprovam que a inovação aplicada gera lucro. Tanto que as companhias mais inovadoras conseguem auferir ganhos superiores a cada novo exercício.

A ciência para ativar este processo de inovação não está no autocontrole, através do qual a motivação torna-se efêmera e o comprometimento se esvai diante da agitação ou do estresse. O êxito está na autorregulação, um processo de vincular metas ao melhor resultado emocional possível.

Um ótimo mecanismo de liderança consiste em comprimir o tempo destinado a uma determinada tarefa ou meta. Assim, relacione suas metas programadas para o período de um ano, por exemplo. Em seguida, estude como realizá-las não em 12 meses, mas em apenas um semestre, um trimestre ou mesmo um único mês.

Lembre-se de que nosso cérebro adora jogar com a segurança. Por isso é tão confortável falar em metas para cinco, dez ou mais anos, pois nada será feito de imediato. Assim, desafie-se! Torne possível o que, à primeira vista, possa parecer impossível.

Chave 3 – Administre a concentração, não apenas o tempo

A neurociência confirma que somos maus administradores de nosso tempo. E, mais do que isso, sofremos forte tendência a perder o foco.

Algumas provocações para sua reflexão:

ü  Em suas reuniões regulares, como você poderia reduzir em 50% ou mais o tempo gasto, mantendo ou melhorando os resultados?
ü  Suas reuniões são agendadas para o início do expediente, por volta das 9h00, ou logo após o almoço, às 14h00, prolongando-se por todo aquele meio turno de trabalho? O que aconteceria se você iniciasse os encontros às 11h00 ou 17h00?
ü  Quanto tempo você desperdiça diariamente em decorrência de interrupções, distrações, desorganização ou falta de planejamento?
ü  Estabeleça uma hora por dia sem interrupções para você e neste intervalo trabalhe concentradamente em três objetivos específicos, reservando 20 minutos para cada um deles;
ü  Um feedback é importante, mas ele atua sobre um evento passado, aprisionando o cérebro e colocando-o na defensiva. Trabalhe com feedforward, ou seja, um impulso emocional positivo para influenciar e mudar de agora em diante.

Chave 4 – Administre a energia, não o esforço

Faça pausas estratégicas de apenas 30 segundos a cada meia hora, e pausas essenciais de dois a cinco minutos no meio da manhã e no período da tarde para aumentar sua energia e concentração.

Você pode fazê-lo realinhando sua postura, respirando profundamente, bebendo água gelada, movimentando-se em direção a uma luz mais forte, entrando em contato com paisagens naturais, situações bem humoradas e expondo-se a mudanças visuais ou mentais. Estas ações podem garantir um incremento de até 50% no seu nível de energia, elevando a produtividade em até 10%. Seja rápido sem se apressar. Mantenha a flexibilidade.

Além disso, administre a transição de seu ambiente profissional para o familiar. Assim, ao chegar em casa, estabeleça uma zona intermediária de até 15 minutos, período no qual deverá apenas cumprimentar carinhosamente seus familiares com no máximo 25 palavras. Procure desacelerar. Tome um banho, troque suas roupas, beba algo. Está comprovado que situações de conflito e argumentos prejudiciais começam ou se intensificam nos primeiros minutos após o regresso ao lar.

Chave 5 – Administre o impacto, não as intenções

O objetivo é reduzir o tempo pela metade e dobrar os resultados. No processo de monitoramento, faça medições semanais – elas aumentam significativamente a iniciativa e a responsabilidade pessoais no cumprimento das metas estabelecidas.

Procure avaliar como andam os níveis de energia e concentração da equipe. Observe as economias de tempo e reduções de custo possíveis, onde foram obtidas e qual sua magnitude. Acompanhe a evolução da eficácia da equipe e o redirecionamento das metas com base no critério da prioridade.

Chave 6 – Compartilhe o propósito

Não são apenas as metas que precisam ser apresentadas à equipe. É fundamental compartilhar missão, visão e valores. As pessoas necessitam de um senso de finalidade para seu trabalho, compreendendo sua real contribuição para a organização.

Contudo, o fato é que muitos sequer sabem qual o produto ou serviço que oferecem ao mercado, quem são seus concorrentes, o que o consumidor espera da corporação e qual a posição estratégica que esta espera ocupar no mercado.

Chave 7 – Lidere com base nas três óticas

Há um objetivo fundamental que é de caráter corporativo. Independentemente de se tratar de uma empresa pública ou privada, os esforços de todos os profissionais devem estar a serviço de um resultado positivo capaz de apoiar, sustentar e conferir reconhecimento à organização.

Porém, para alcançar este resultado, o líder deve centrar foco na equipe, pois é o trabalho conjunto e multidisciplinar o instrumento catalizador do alto desempenho. Um líder deve questionar sua equipe sobre seu aprendizado buscando contribuição e não julgamento.

Mas equipes são formadas por pessoas e este é o último e essencial ponto de vista: o elemento humano. O desafio é conhecer, compreender e auxiliar cada colaborador a alcançar seus objetivos pessoais, enxergando-os como projetos de vida individuais.

Todos os dias os melhores líderes desistem de tudo o que conquistaram para se reinventar na busca pela excelência. Deve-se jogar para ganhar. Ir até onde for possível usando todos os recursos de que se dispõe. Porém, liderança é um jogo de estilo. Não é o que você faz que conta, mas como você faz.


quinta-feira, 7 de julho de 2011

Quinze anos

“Há vários motivos para não se amar uma pessoa.
E um só para amá-la.”
(Carlos Drummond de Andrade)


Há uma queixa recorrente e consensual entre as mulheres. Atualmente está se tornando uma missão quase impossível encontrar um homem que reúna características como cavalheirismo, inteligência e intelectualidade aos atributos de um autêntico Don Juan, tais como masculinidade, sensualidade e beleza física. Tudo o que elas querem é alguém capaz de tirar-lhes o fôlego, surpreendê-las, fazê-las perder a racionalidade. Mas que depois as traga de volta ao plano terreno, à objetividade e pragmatismo necessários, sem deixar esvair o encantamento.

Há também um consenso entre os homens. Nos dias de hoje, há mulheres para se curtir e mulheres para se namorar. E raramente são as mesmas. A expressão usual assemelha-se a: “Uma garota como essa não se encontra por aí... Cuide bem dela, mantenha este relacionamento. E aproveite para se divertir com as mulheres erradas, enquanto isso”.

Entre um universo e outro, o que os une é a solidão. Mulheres de um lado, homens de outro, compartilhando a vida com amigas e amigos, à espera de serem “tirados para dançar”. Parece que a sociedade moderna nos robotizou, tornou-nos tão mecânicos que perdemos a capacidade de nos apaixonar. E, mais ainda, de amar. Construímos um muro em nosso redor com tijolos de intolerância. Ficamos tão seletivos que terminamos sós.

Amar é olhar para outra pessoa e, mais do que admirá-la, contemplá-la, observando seus traços, suas feições, seus movimentos, e não desejar perder nem um milésimo de segundo, negando-se até mesmo a piscar. É ver a imagem da pessoa amada refletida em outdoors, estampada no rosto de personagens da televisão. É ter uma música em comum que marca um momento especial ou que se tornou especial por apenas representar a lembrança de um momento. Lembro-me de Mário Quintana: “Amar é mudar a alma de casa”.

Amar é dialogar, o que significa falar, mas também saber ouvir. Ter a sensibilidade para perceber quando o outro precisa apenas dizer tudo e de todas as formas, muitas vezes sem a preocupação de que você esteja ouvindo. Basta sua presença. Olhos que sinalizam atenção, silêncio que pronuncia respeito. Acolhimento, conforto, generosidade. Dar como alimento o carinho.

Amar é descoberta. É desvendar sem pressa o passado de quem se gosta não pela neurose de uma investigação, mas pelo prazer de apreciar aquela história como quem ouve um pequeno conto infantil ditado pelos pais ao lado da cama.

Amar é tolerância, é concessão. Não significa mudar e nem exigir que se mude, mas estar disposto a se adaptar e esperar que se faça o mesmo. Ajustar expectativas, alinhar propósitos. É caminhar lado a lado, olhando unidos na mesma direção, ainda que com visão periférica apurada. Maiakovski pontuou acertadamente: “Amar não é aceitar tudo. Aliás, onde tudo é aceito, desconfio que haja falta de amor”.

Amar é transparência, é dizer o que se pensa, sabendo a hora de falar. É não praticar a omissão achando ser possível empurrar conflitos para sob o tapete até que um dia o vento espalhe tudo, maculando o que foi construído. Transparência que gera credibilidade, que leva à confidencialidade, que conduz à lealdade. A lealdade que surge não como um dever, mas como resultado da satisfação do exercício da plenitude, de sentir-se completo.

Amar é tocar. É beijo que acelera o pulso. Sexo com longas preliminares e aconchego posterior. Dormir abraçado, acordar junto. Filme com pipoca, chuva romântica do lado de fora. Cuidar e ser cuidado. Promessas insanas de juras eternas – a eternidade que se perde num instante. É dividir a liberdade.

Amar é superar adversidades, enfrentar o desafio da geografia que, às vezes, distancia fisicamente dois corações. É sentir a saudade como fruto da partida.

Amar é intensidade, é compreender a impermanência do tempo, sua relatividade. Significa rasgar os estúpidos calendários, quebrar os imponentes relógios e compreender que o tempo tem outra dimensão. É preferível um amor intenso de 48 horas a uma vida insípida compartilhada por uma década.

Amar é se mostrar um grande espelho e permitir que o outro possa mirar-se em você. Ver a si próprio enxergando aquilo que é mais virtuoso, mais nobre. É ver de maneira perfeita uma pessoa imperfeita. É buscar o equilíbrio, tomar cuidado com a ansiedade, a angústia, a incompreensão e as cobranças. É ter coragem de também sofrer.

Amar é tudo isso e um pouco mais. Ação que não se descreve, mas que se pratica. Coisas que sabíamos fazer quando adolescentes, aos quinze anos, quando éramos mais intrépidos, menos racionais e, por isso, capazes de ser mais felizes.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

A hora de parar


* por Tom Coelho

“Por um cravo, perde-se a ferradura,
por uma ferradura, um cavalo,
e, por um cavalo, o cavaleiro.”
(Frei Luis de Granada)


Ambição é uma coisa boa. Ela nos desperta desejos, promove o comprometimento, estimula a perseverança. Torna-nos mais fortes e nos faz buscar a superação. Pela ambição conquistamos mais posses e mais poder. Sentimo-nos mais ricos, mais bonitos e até mais livres. O que a estraga é a ganância.

Como tudo na vida que desgarra da ponderação do equilíbrio, a ambição desmedida evolui para a ganância. Nesse estágio, o desejo vira cupidez; o comprometimento, obsessão; a perseverança, teimosia. As posses denotam opulência; o poder, prepotência. A liberdade se esvai e renasce como fênix, enjaulada.

O problema é uma questão de proporção. Na escalada para o progresso, não sabemos – ou não aceitamos – a hora de parar.

Tome como exemplo o mundo corporativo. Uma empresa lança um produto ou serviço que é bem aceito pelo mercado. Realiza um lucro considerável e resolve reinvesti-lo. E, ao prosseguir nesse processo, eleva ainda mais seu volume de vendas e faturamento. Mas também seus custos. A cada nova rodada, mais matéria-prima e mais mão de obra são necessárias. Os investimentos em marketing e infraestrutura, entre outros, são igualmente crescentes.

O que muitas vezes não se observa é que há um determinado momento em que o processo deve ser interrompido sob pena de se ingressar no que a teoria econômica chama de “deseconomia de escala”. A matemática tem uma imagem singular para ilustrar isso: o ponto de inflexão. Num gráfico cartesiano, é o momento em que a curva muda sua concavidade, ou seja, se a linha era crescente, passa a ser decrescente.

Em suma, isso significa que mais faturamento não representará indefinidamente mais lucro. Ou seja, trabalha-se mais para ganhar-se menos! E tudo porque a ambição, antes saudável e responsável pela prosperidade do negócio, visita o reino da ganância e não aceita o momento de parar quando o ótimo foi atingido.

Na vida pessoal não é diferente. Defendo a tese de que relacionamentos amorosos, por exemplo, têm prazo de validade. E me alinho aos votos sagrados de “até que a morte os separe” juramentados na celebração dos casamentos. O ponto é: de qual morte estamos falando? As pessoas imaginam tratar-se da morte física. Prefiro interpretar como a morte do sentimento.

Todo início de relacionamento é mágico. É quando se pratica o jogo da conquista e da sedução. Nossas ações são orquestradas e as palavras escolhidas de forma meticulosa. Mostramos o que temos de melhor: nossa vida é virtuosa, nossos valores são nobres e nossos feitos são admiráveis. Vestimos as melhores roupas, usamos os mais agradáveis perfumes. A pele tem viço; o olho, brilho; o sorriso, autenticidade.

Os ambientes por onde circulamos são aconchegantes. A bebida parece sempre gelada, mesmo que seja um conhaque, e a comida sempre saborosa, mesmo que não seja consumida.

Tudo isso acontece porque estamos envoltos numa atmosfera de encantamento e sinergia, embevecidos pela eficiência do diálogo, que corre fácil, posto que há muito por se falar, anos para se compartilhar. Queremos em um par de horas nos desnudar, não apenas das roupas, mas de nossa história pessoal, mostrando quem somos, de onde viemos e para onde queremos ir – e o destino reserva lugar ao interlocutor, a figura amada, quase inanimada, que nos sorri.

O processo é o mesmo para homens e mulheres. Diferem as estratégias, as táticas, mas não os propósitos.

Transcorrida essa etapa consuma-se a conquista. Bocas que se encontram, braços que se enlaçam, corpos que se aquecem. E então, vive-se o romance que nutre e cega. O horizonte se retrai.

A estabilidade leva a relação a mares calmos e a ausência de ondas revela o que antes não se podia enxergar. Descobrimos – e revelamos – que virtudes carregam consigo defeitos, que amabilidade é temperada com eventual intolerância e que gentilezas são bonificadas com fleuma.

É nesse momento que se estabelecem os limites entre paixão e amor. É quando a união amadurece. É quando percebemos que o beijo ardente e o sexo prazeroso são imprescindíveis, mas não únicos. O diálogo ganha novos temas, mas não se perde. E notamos, como bem pontuou Gabriel García Márquez, que amamos quem está conosco não por quem a pessoa é, mas por quem nos tornamos na presença dela.

Agora, trata-se de manutenção. De conquistar um pouco mais a cada dia. Ou tudo novamente.

Mas a natureza nos reservou um mundo dual. Dia e noite, quente e frio, yin e yang. E, não raro, os relacionamentos não apenas se desgastam, mas se esgotam. Não há mais calor no beijo, os olhares se desviam, os diálogos são fúteis. Primeiro, a discórdia. Depois, o conflito. Por fim, o confronto. Transformamos nossas cabeças num cemitério de lembranças e passamos a cultivar toda ordem de sentimentos negativos. O pacote vem completo, com mágoas, ressentimentos, infidelidade, desamor e tristeza. Esperamos resolutamente que um extremo seja alcançado para tomar a decisão da separação que poderia ter florescido quando ainda havia respeito e admiração mútuos.

Não sabemos terminar.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

A Força da União


* por Tom Coelho

“A união do rebanho obriga o leão a deitar-se com fome."
(Provérbio africano)


Fusões, aquisições e joint ventures sempre aconteceram no mundo corporativo, mas foram intensificadas no decorrer da última década. A busca por maior competitividade tem conduzido o mercado a um processo de concentração. A regra é unificar operações para reduzir custos operacionais.

Os exemplos são variados. Itaú e Unibanco, no segmento bancário; Submarino e Americanas, no comércio eletrônico; Gafisa e Tenda, na construção civil; Sadia e Perdigão, no setor alimentício; Casas Bahia e Pão de Açúcar, entre os supermercadistas. E ainda temos as incursões de empresas brasileiras no exterior, com destaque para a compra da Pilgrim’s pela Friboi, da Inco pela Vale, e mais recentemente, da Burger King pela ABInBev.

Note que em todos estes casos estamos diante de empresas de grande porte. De fato, desde sempre as grandes corporações compreenderam que melhor do que uma boa briga é um bom acordo, de forma que em muitos mercados encontramos a polarização da disputa pela liderança entre duas ou três companhias. Assim nasceram muitos dos oligopólios e, por consequência, alguns conselhos governamentais em defesa da livre concorrência.

Contudo, entre as pequenas e médias empresas o quadro é bem adverso. Elas tendem a cultivar uma grande rivalidade, enxergando concorrentes como inimigos mortais. Neste contexto, chegam até a praticar dumping (vender abaixo do custo) para ganhar clientes de modo que o final desta história é sempre a guerra de preços que reduz as margens de lucro e fragiliza as empresas.

É neste cenário que sindicatos e associações de classe ganham evidência, pois lutam por interesses comuns do empresariado, ora pleiteando ao governo a adoção de uma política tributária mais favorável capaz de estimular a geração de emprego e renda, ora combatendo o contrabando e as importações subfaturadas que reduzem a competitividade, ora confrontando a concorrência desleal praticada por empresas informais.

Independentemente de seu setor de atuação, seja você industrial, agricultor, comerciário ou prestador de serviços, se sua empresa ainda não é afiliada a alguma associação, cooperativa ou entidade de classe, considere fazê-lo em seu planejamento estratégico deste início de ano. Este é o melhor caminho para fortalecer o setor e tornar seu negócio ainda mais próspero!


* Tom Coelho é educador, conferencista e escritor com artigos publicados em 15 países. É autor de “Sete Vidas – Lições para construir seu equilíbrio pessoal e profissional”, pela Editora Saraiva, e coautor de outros quatro livros. Contatos através do e-mail tomcoelho@tomcoelho.com.br. Visite: www.tomcoelho.com.br e www.setevidas.com.br.


sexta-feira, 4 de março de 2011

Diferenciação


“Quando todos pensam igual é porque ninguém está pensando.”

(Walter Lippman)



Dia destes entrei em uma loja Fran’s Café para um espresso com pão de queijo. Fiquei surpreso ao receber o café cuidadosamente apoiado sobre uma pequena bandeja, acompanhado de um elegante copo contendo água mineral gasosa e um folheto explicando tratar-se de uma tradição italiana: a água com gás aguça as papilas, enaltecendo o sabor do café que será sorvido. E toda esta atenção sem custo adicional.

Num destes finais de semana, dirigi-me a um cinema da rede Cinemark acreditando que, em virtude do grande número de salas, as filas seriam pouco significativas. Ledo engano. Apreciei fila para adquirir o ingresso, fila para acessar a sala e fila para comprar pipoca e refrigerante a preços aviltantes.

Meses atrás, resolvi retomar a prática da natação e fui ter um diálogo com minha antiga academia, a Runner. Solicitei-lhes uma condição diferenciada para regressar, mas responderam que eu deveria me adequar às normas vigentes para novos alunos. Seria uma assertiva aceitável, se não tivesse partido do departamento de fidelização da empresa que, teoricamente, deveria zelar pela manutenção de seus associados.

Três situações distintas, envolvendo empresas de renome, que nos fazem refletir sobre a questão dos preços relativos e, acima disto, sobre o que vem a ser diferenciação.


Concorrência monopolística

Lembro-me das aulas de microeconomia e da dificuldade em aceitar certos conceitos que entravam em rota de colisão com minha lógica. Uma exceção foi-me apresentada quando estudava a organização dos mercados e a formação de preços.

Segundo a teoria em que os mercados operam em concorrência perfeita ou imperfeita, o primeiro tipo caracteriza o modelo ideal: muitas empresas participantes, ausência de barreiras à entrada e saída do mercado, políticas de preços não regulamentadas.

O segundo tipo é formado pelo monopólio, quando uma única empresa atua isoladamente no mercado, normalmente impondo barreiras técnicas, econômicas ou burocráticas à entrada de novos players, praticando uma política de preços própria que precisa ser regulada por um órgão neutro; pelo oligopólio, que se diferencia do monopólio apenas pelo fato de haver mais de uma companhia atuando no mercado, porém não muitas; e pela concorrência monopolística.

Esta última modalidade guarda consigo um conceito interessante. Aborda uma situação em que as empresas atuam dentro de um mercado altamente concorrencial, onde não há entraves de qualquer ordem e todos enfrentam as mesmas oportunidades e dificuldades. Todavia, dentro deste contexto, uma empresa pode se destacar mediante a diferenciação de seu produto ou serviço. Fazer algo diferente, tornando-se única, exclusiva e desejada no coração e na mente do consumidor. Tecnicamente, criar um nicho tão bem delimitado que a capacita para exercer um autêntico monopólio. Por isso, concorrência monopolística.

À luz deste conceito, passei a observar como estamos o tempo todo exercendo a concorrência monopolística em nossas vidas. A começar pela vitória do espermatozoide tenaz que, dotado de agilidade, velocidade e preparo, supera todos os demais concorrentes no ato da fecundação. Ao conquistar o par romântico, também nos fizemos notar em meio aos demais pretendentes. A oportunidade de emprego também foi sancionada com êxito dentre outros postulantes ao cargo.


Responsável por quem cativas

Assim, comecei a nutrir verdadeira paixão pelo conceito de diferenciação. Passei a compreender o porquê de deixar mais reais por um pão de queijo no Fran’s Café, quase sem perceber – é porque quero o mimo. Passei a compreender o porquê de aceitar ser expropriado por uma pipoca e um refrigerante num Cinemark – é porque quero a comodidade. Passei a compreender o porquê de ter perdido o encanto pela Runner – é porque quero coerência no discurso que me vendem.

“Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...”

O Pequeno Príncipe, de Exupéry, conhecia muito de concorrência monopolística quando cunhou a famosa expressão “tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”. Por isso, abrir a porta do carro para a garota adentrá-lo torna o cavalheiro admirado. Por isso, o vendedor que procura descobrir a necessidade de seu cliente para depois lhe apresentar uma solução é preferível ao mero tirador de pedidos. Por isso, a empresa que identifica o desejo mais subliminar de seus consumidores pode dar-se ao luxo de vender o que produz ao invés de produzir o que se vende.

Mas, no jogo da diferenciação, que fique clara uma coisa. Não é a diferenciação tecnológica (baseada nas inovações), a qualitativa (sediada na adequação) ou a mercadológica (ancorada na força e glamour das marcas) que conferem perenidade às relações. O mundo está comoditizado. Os produtos apresentam as mesmas características, os profissionais detêm os mesmos MBAs, a comunicação está massificada. A única diferenciação efetivamente sustentável ao longo do tempo é aquela baseada em pessoas. No brilho do olhar, na maciez da voz e no calor do toque, aspectos que máquina ou virtualidade alguma será capaz de reproduzir ou substituir.